Morre Margaret Thatcher, figura política central do
século 20
Um discurso de 1976 contra as políticas repressoras aplicadas na antiga União Soviética lhe rendeu o apelido de “Dama de Ferro”- título que lhe agradava. |
A
ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher morreu na manhã desta
segunda-feira em Londres, aos 87 anos, após sofrer um derrame. Thatcher foi a
primeira mulher a ocupar o posto de primeiro-ministro no país, e permaneceu no
cargo de 1979 a 1990, pelo Partido Conservador.
"É com grande
tristeza que Mark e Carol Thatcher anunciam que sua mãe, a baronesa Thatcher,
morreu pacificamente após um derrame nesta manhã", disse o porta-voz da
ex-premiê, Lord Bell.
Thatcher foi uma
das mais influentes figuras públicas do século 20. Seu legado teve um efeito
profundo nas políticas de seus sucessores, tanto conservadores como
trabalhistas, enquanto seu estilo considerado radical e agressivo definiu seus
11 anos no comando da Grã-Bretanha.
Thatcher e o
presidente americano Ronald Reagan
compartilhavam de
opiniões semelhantes sobre economia
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Durante seu governo
conservador, milhares de britânicos conseguiram comprar casas populares e ações
de empresas recém-privatizadas nas áreas de energia e telecomunicação.
Mas sua rejeição à
chamada "política de consenso" fez dela uma figura desagregadora, e a
oposição ao seu governo culminou com rebeliões nas ruas e dentro de seu próprio
partido.
Margaret Hilda
Thatcher nasceu em 13 de outubro de 1925 no condado de Lincolnshire, filha de
um dono de mercearia, que era pregador metodista e político local. Ele teve
enorme influência na vida da filha – bem como nas políticas que ela adotou.
“Devo quase tudo a
meu pai, de verdade”, ela diria mais tarde.
Thatcher estudou
Química em Oxford, com o auxílio de uma bolsa de estudos, e se tornou a
terceira mulher a presidir a Associação Conservadora da universidade.
Jovem candidata
Depois de se
formar, trabalhou para uma empresa de produtos plásticos e se envolveu em um
grupo político conservador, até que, a partir de 1949, começou a concorrer a
cargos no governo local em Kent.
Mesmo sem vencer,
ela atraiu atenção da imprensa por ser a mais jovem candidata eleitoral
conservadora da História.
Em 1951, ela se
casou com o empresário divorciado Denis Thatcher, com quem teve os gêmeos Mark
e Carol, dois anos depois.
Em 1959, finalmente
obteve um assento no Parlamento britânico. Foi nomeada logo em seguida
ministra-júnior e, após a derrota dos conservadores em 1964, entrou para o
“shadow cabinet” (gabinete de oposição que monitora o trabalho do governo).
Ganhando
proeminência no partido, Thatcher passou a fazer campanha vigorosa contra
impostos no governo trabalhista e a favor da construção de casas populares.
Quando o
conservador Ted Heath foi eleito premiê, em 1970, Thatcher foi promovida a
secretária da Educação e ordenada a reduzir os gastos da pasta. Um dos cortes
resultou no fim de uma campanha de leite gratuito nas escolas, o que gerou
fortes críticas dos trabalhistas e o apelido de “Margaret Thatcher, milk
snatcher” (algo como ladra de leite).
Ela própria havia
se oposto ao corte dos subsídios para a compra do leite. Depois do episódio,
escreveu: “Aprendi uma lição valiosa. Incorri no máximo de ódio político (em
troca) do mínimo de benefício político”.
Primeira-ministra
O governo Heath,
afetado pela crise do petróleo de 1973, caiu no ano seguinte. Crítica da
condução da economia promovida pelo premiê, Thatcher disputou com ele a
liderança do partido em 1975 e, para surpresa geral, venceu. Tornou-se a
primeira mulher a liderar um partido de grande porte na Grã-Bretanha.
Logo começou a
deixar sua marca na política. Um discurso de 1976 contra as políticas
repressoras aplicadas na antiga União Soviética lhe rendeu o apelido de “Dama
de Ferro”- título que lhe agradava.
Quando o premiê
trabalhista Jim Callaghan recebeu um voto de desconfiança do Parlamento, o
Partido Conservador venceu as eleições gerais em 1979, e Thatcher foi alçada ao
poder.
Livre mercado
Como
primeira-ministra, ela estava determinada a moralizar as finanças públicas, e
partiu para a redução do papel do Estado e o incentivo ao livre mercado.
O controle da
inflação era uma meta central do governo, que introduziu um corte radical nos
gastos e nos impostos. Privatizou empresas estatais, fomentou a compra de casas
populares e aprovou leis para coibir a militância sindical.
As novas políticas
monetárias fizeram do centro financeiro de Londres um dos mais vibrantes e
bem-sucedidos do mundo.
Em busca de um país
mais competitivo, antigas indústrias foram desativadas. O desemprego cresceu.
Apesar de pressão
popular, Thatcher não cedia. Em uma conferência partidária de 1980, ela
declarou: “Aos que esperam por uma guinada, só tenho uma coisa a dizer: dêem a
guinada se quiserem. Essa dama não volta atrás”.
No fim de 1981, sua
taxa de aprovação havia caído para 25%, nível mais baixo registrado para
qualquer premiê até então.
No ano seguinte, a
economia iniciou sua recuperação e, com isso, cresceu a popularidade de
Thatcher.
Guerra e terceiro mandato
A aprovação deu um
salto maior em abril, com sua guerra contra a Argentina pelas ilhas Malvinas,
vencida em 14 de junho.
A vitória bélica,
somada a desarranjos no Partido Trabalhista, resultaram em nova vitória
conservadora nas eleições de 1983.
Nessa época,
Thatcher enfrentou desafios na Irlanda do Norte, como greves de fome de membros
do IRA (Exército Republicano Irlandês), e manteve uma abordagem linha-dura
perante o grupo.
Em outubro de 1984,
o IRA detonou uma bomba numa conferência do Partido Conservador em Brighton,
deixando quatro mortos e dezenas de feridos.
Em resposta,
Thatcher declarou: “Este ataque falhou. Todas as tentativas de destruir a
democracia com terrorismo falharão”.
Sua política
externa era focada em reconstruir laços externos da Grã-Bretanha. Teve como
parceiro o presidente americano Ronald Reagan, com quem compartilhava opiniões
semelhantes sobre a economia, e manteve uma aliança improvável com Mikhail
Gorbachev, presidente soviético reformista.
Ante a
desestruturação do Partido Trabalhista, a premiê foi, de forma inédita, eleita
para um terceiro mandato em 1987.
Uma de suas
primeiras ações foi impor uma taxação sobre serviços públicos, que despertou
uma forte onda de protestos violentos no país e insatisfação dentro do próprio
Partido Conservador. Mas o que acabou levando a sua queda foi a questão da
unidade do continente europeu.
Após um debatido
simpósio sobre o euro ocorrido em Roma, Thatcher ela rechaçou a possibilidade
de aumento de poder da comunidade europeia.
Após a saída de
importantes membros de seu gabinete e sob pressão do partido, a premiê disse se
sentir traída e anunciou sua renúncia em novembro de 1990.
John Major foi
eleito para sucedê-la.
Legado
Após deixar o
poder, ela recebeu o título de baronesa, escreveu dois livros de memórias e se
manteve ativa na política, fazendo campanha contra o Tratado de Maastrich (que
pavimentou terreno para a adoção do euro) e contra a política sérvia de limpeza
étnica na Bósnia.
Foi forçada a
reduzir sua atuação pública em 2001, quando sua saúde começou a se deteriorar.
Após sofrer uma série de pequenos derrames, seus médicos advertiram contra
aparições públicas, nas quais ela se revelava cada vez mais fragilizada. Além
disso, Thatcher sofria de problemas mentais, que afetavam sua memória de curto
prazo.
Em 2003, seu marido
Denis morreu aos 88 anos de idade.
“Ser
primeira-ministra é um trabalho solitário. (...) Mas com Denis ali eu nunca
estava sozinha. Que homem. Que marido. Que amigo”, disse ela, na ocasião, em um
discurso emocionado.
Para seus críticos,
Thatcher foi uma política que colocou o livre mercado acima de tudo. Foi
acusada por muitos de deixar que parte da população pagasse o preço por
iniciativas que aumentavam o desemprego e geravam distúrbios sociais.
Para seus
simpatizantes, a ex-premiê reduziu o tamanho de um Estado inflado e a
influência dos sindicatos, além de restaurar a força britânica no mundo.
Acima de tudo, ela
foi uma política de opiniões firmes. Sua crença de que não deveria ceder em
suas convicções mais enraizadas foi sua maior força e, ao mesmo tempo, sua
maior fraqueza, diziam muitos.
Sua filosofia pode
ser ilustrada por uma entrevista que deu em 1987. “Acho que passamos por um
momento em que muitas crianças e pessoas foram levadas a crer que ‘se tenho um
problema, cabe ao governo lidar com ele’. ‘Sou sem-teto, o governo tem de me
dar uma casa. Eles (as pessoas) jogam seus problemas sobre a sociedade, e quem
é a sociedade? Isso não existe! (...) É nosso dever cuidar de nós mesmos e
então ajudar a cuidar de nossos vizinhos. A vida é um negócio recíproco, e as
pessoas mantêm em mente os direitos, (mas) sem as obrigações.”
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