SÃO BERNARDO DO CAMPO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso inflamado a uma multidão neste sábado, afirmou que vai atender de “cabeça erguida” ao mandado de prisão do juiz federal Sérgio Moro, e reafirmou sua inocência, um dia depois do fim do prazo dado pelo magistrado para o petista se apresentar à Polícia Federal.
“Esse pescoço não baixa, eu vou de cabeça erguida e vou sair de peito estufado de lá e vou provar minha inocência”, disse, em exaltado pronunciamento de 55 minutos no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP).
“Quero chegar lá e dizer ao delegado, estou à sua disposição”, disse, no primeiro pronunciamento público depois de emitida a ordem judicial para cumprir pena pela condenação no processo de tríplex do Guarujá, no litoral paulista.
Lula, com 72 anos, destacou que vai cumprir o mandado para fazer a “transferência de responsabilidade” para mostrar que o “problema” do país não é ele, mas sim aqueles que não gostam do “povo”, do PT, dos partidos políticos de esquerda, entre outros.
“Vou atender o mandado deles, porque quero fazer a transferência de responsabilidade”, disse.
O ex-presidente afirmou que não está “escondido” e que vai lá “nas barbas deles”. E ressaltou que vai cobrar quanto tempo vai ficar preso —ele teve a condenação a 12 anos e 1 mês de prisão, em regime fechado, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Durante o ato, o petista conclamou os que estavam presentes a, de agora em diante, “virar Lula” e andar pelo país e mostrar o que é preciso fazer. “Quanto mais dias eles me deixarem lá, mais Lula vai nascer nesse país”, disse.
Lula estava desde a noite de quinta-feira no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde o petista iniciou a vida política, acompanhado por familiares, militantes do PT, integrantes do sindicato, parlamentares e simpatizantes.
O juiz Sérgio Moro havia determinado na quinta-feira prazo até as 17h de sexta-feira para Lula se apresentar na PF de Curitiba para iniciar o cumprimento da pena.
Desde então, a defesa de Lula vinha tentando reverter a medida, o que foi negado pelo Judiciário. Neste sábado, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, negou pedido para que a corte concedesse liminar para suspender a ordem de prisão. Na véspera, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia rejeitado um pedido de liminar em habeas corpus para garantir a manutenção da liberdade de Lula.
Ainda não há informações sobre o momento da apresentação de Lula a autoridades, que deve ocorrer na capital paulista para que depois ele seja levado a Curitiba. Aliados do petistas não divulgaram como seria, e a Polícia Federal informou que a operação é mantida sob sigilo.
PROVAS
Mais uma vez, Lula afirmou está sendo “processado” —na verdade ele já é condenado— por ser dono de apartamento no Guarujá, alegando que é único ser humano a ser processado por ter um apartamento que não é dele. O ex-presidente criticou por isso a mídia, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o juiz Sérgio Moro.
“Eu não os perdoo por ter passado para a sociedade a ideia de que eu sou um ladrão. Deram a primazia dos bandidos fazer um Pixuleco, chamar a gente de petralha”, protestou Lula, para quem nenhum deles tem a coragem ou dorme com a consciência tranquila da honestidade.
O ex-presidente afirmou que não está “acima da Justiça” e destacou que, se não acreditasse nela, não teria fundado um partido político, mas sim feito uma revolução. Disse, ainda, que não é contra a Lava Jato. “Tem que pegar bandido e prender”, afirmou.
“Acredito numa justiça justa baseada nos autos do processo, na prova concreta do crime”, disse. “O que não posso admitir um procurador que fez um power point e foi para a TV dizer que o PT é uma organização criminosa para roubar o Brasil e o Lula é o chefe”, completou Lula, numa referência ao procurador Deltan Dallagnol. O ex-presidente ainda é réu em outros seis processos.
O petista atribuiu, ainda, ao que considerou como “atencipação da morte” da esposa, Marisa Letícia, a uma “safadeza” e “sacanagem” da imprensa contra ela. O evento do sábado marcou o aniversário da esposa falecida de Lula, ela também alvo do mesmo processo de Lula no caso do tríplex.
Durante o ato religioso em homenagem a Marisa Letícia, a multidão gritava a Lula: “Não se entrega” e “resistência”. Muitas pessoas choraram durante a cerimônia, especialmente com o discurso do ex-presidente.
“GOLPE”
Lula fez duras críticas à suposta pressão da imprensa, chegando até mesmo a defender o controle dos meios de comunicação.
“A história vai mostrar que quem cometeu o crime foi o delegado que me investigou, o juiz que me condenou e o Ministério Público foi leviano comigo”, afirmou o petista, que chegou a cobrar um “debate” com Moro e os desembargadores do TRF-4 para que eles mostrassem qual crime ele cometeu no país.
O ex-presidente disse ainda que o “golpe” não estava completo somente com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e que seria necessário impedir que o petista concorresse a um novo mandato ao Palácio do Planalto em 2018.
O petista —líder nas pesquisas de intenção de voto à Presidência da República— afirmou que, quanto mais ele for atacado, mais cresce a sua relação com o povo brasileiro. Reclamou também de autoridades do Judiciário que estariam julgando conforme à opinião pública.
“Quem quiser votar (no Judiciário) com base na opinião pública largue a toga e vá ser candidato. Escolha um partido político e vá ser candidato”, provocou.
ACENOS
No início da sua fala, o ex-presidente —que durante o discurso não anunciou se manterá seu nome na corrida ao Planalto— fez acenos a três nomes cotados para concorrerem a presidente da República: o petista e ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, tido dentro do partido como sucessor de Lula a legenda; e dos pré-candidatos por partidos de esquerda, Guilherme Boulos, do PSOL, e Manuela D’Ávilla, do PCdoB.
Na manifestação mais enfática, Lula fez aceno a Boulos, quem disse ser um importante quadro político em formação. “Você tem futuro, meu irmão, é só não desistir nunca”, disse. Foi na mesma linha com Manuela D’Ávila. “É um motivo de orgulho e perspectiva de mudança para enfrentar a negação da política assumindo a política”, disse.
Com reportagem adicional de Ricardo Brito, em Brasília
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